domingo, 11 de janeiro de 2009

[ShortStory] Tenjin, a princesa

Dizem que todas as crianças querem crescer. Eu também queria… Mas se soubesse… nunca teria feito dezasseis anos…
- Tenjin, acorda. Estamos a ser atacados. Vai-te esconder, rápido. Anda mexe-te. Vai para o esconderijo com a tua irmã. Eu vou buscar o teu irmão.

Não sei como o barulho das explosões não me acordou primeiro. Devia estar mesmo cansada da festa. Hoje faço dezasseis anos.

- Mas mãe, não vás por aí. Fica connosco. Tenho medo. – Dizia Kami, a minha irmã mais nova.
- Vão-se esconder, tenho de ir buscar o vosso irmão.
- Não… mãe… - gritava ela, enquanto eu a arrastava para o esconderijo. Também não me agradava nada deixar a mãe assim, mas tinha de proteger a minha irmã.

E essa foi a última vez que vi a minha mãe viva. A minha mãe, o meu irmão, o meu pai, todos morreram naquela fatídica noite. A noite dos meus dezasseis anos. Tinha-me divertido tanto na festa. Não é costume celebrarmos em tempo de guerra. O que queria dizer que desde que nasci esta foi a primeira festa que tive. Parecia que o meu pai previa o que iria acontecer mais tarde.

Na manhã seguinte, no funeral, enquanto o monge cantava o sutra, eu sentia aquele cheiro... aquele cheiro que se entranha, que nos deixa a cabeça a andar à roda, que nos enlouquece e nos dá força… Aquele cheiro… a morte e tinha sede… uma sede de vingança. Pensava, porque querem dominar o nosso clã? Só temos o templo. Sado Shinrakuji, sinto-me tão bem lá.

Mas hoje aquele templo não era um local agradável para se estar, cheirava a morte. As suas paredes choravam, lágrimas de sangue.

Foi neste dia que recebi a Espada do Dragão, apenas dada ao líder do clã após a morte do anterior. A prova viva de que uma rapariga de dezasseis anos pode comandar um clã. Eu era tão nova, estava tão cheia de vida, com tanta raiva e eles tão desanimados. Precisavam de alguém que os incentivasse a lutar. Para eles era uma questão de vida ou morte, para mim a derradeira vingança.

Eu não já não queria saber se o clã Uesugi dominava o nosso, se os matava ou os escravizava. Se tinham comida ou água. Eu só queria vingar-me. Vingar-me de quem os matou, de quem matou parte de mim, de quem aniquilou a minha identidade e me obrigou a assumir um papel que não era meu. Quem devia estar aqui era o meu pai.

Enquanto me entregava a espada Yamato, o nosso tutor, dizia – Tenjin, teu pai foi vítima de uma armadilha, honra a sua memória. A partir de hoje lideras este clã. Eles ouvem-te, farão tudo o que disseres. O seu destino está nas tuas mãos. Não terás descanso. Vais ser posta à prova todos os dias.
- Mas Yamato, alguém tem de me explicar o que aconteceu. Foi o Uesugi, não foi? Dizem que ele é imortal. A mim não me interessa, vou matá-lo. Custe o que custar! Tens de me ajudar.
- Não sejas louca. Não tens poder suficiente! Ainda tens muito que treinar antes de conseguir.
- Então treina-me! Posso não ter a experiencia suficiente mas tenho a vontade. Tenho vontade de o matar, de lhe arrancar o coração e deixá-lo para ser comido pelos lobos. A minha ira é a minha força!
Sem dúvida, a minha ira era a minha força. Era ela que me comandava. Era ela que me dava forças para não chorar, para me aguentar em pé, para continuar a viver. Era ela que falava por mim quando discursei perante os soldados, mulheres e crianças do clã. Quando lhes disse que os iria proteger, que não iria deixar nada nem ninguém destruir tudo o que os meus antepassados demoraram tantos anos a construir. No inicio estavam um pouco desconfiados mas à medida que eu libertava a minha ira disfarçada em palavras de confiança e incentivo, eles começavam a ouvir-me.

Disse-lhes que teríamos grandes batalhas pela frente, que nunca iríamos ter paz enquanto não dizimássemos o clã Uesugi. Que me iria preparar para a batalha final, que iria usar todas as minhas forças para os livrar para sempre daquela ameaça. A batalha poderia durar anos e eles tinham de estar preparados para sofrer, matar e morrer. Nesta altura já quase não tinha voz de tanto gritar e eles… eles aclamaram-me, empunharam as armas, bateram palmas.

Coitados! Não faziam ideia do que aí vinha, dos horrores que teríamos de enfrentar...

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