quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

[ShortStory] Kali, a aranha

"Kali, a aranha" - um pequeno momento de ficção

Ali estava eu... naquele canto escuro, perdida, cansada, ferida, encolhida, a tremer de frio e de medo. Sozinha na escuridão. Naquele buraco. - Tem de haver uma saída. Eu não vou morrer aqui!

Havia uma pequena fresta por onde entrava uma luz ténue que de forma sombria iluminava o canto oposto da sala. Foi então que vi, a unica saída dava para um túnel frio e húmido, cheio de musgo esverdeado nas paredes. - Tenho de sair por ali é a única hipótese, não consigo subir por onde caí...

Mas lá estava ela! O único obstáculo entre mim e a saída. Tinha medo, queria sair dali.
Lá estava ela, uma aranha. Uma aranha grande e gorda, patuda e peluda. Sem dúvida a maior aranha que alguma vez vi, talvez maior que eu. Fitava-me com uma expressão sádica de quem está prestes a atacar-me e gosta. Parecia que gostava de sentir o meu medo, parecia que o cheirava.

Levantei-me com a ajuda da espada, sentia-me tão fraca, sem forças para lutar. - Estou cansada, não quero lutar mais, só quero ir para casa. Maldita a hora em que cai neste buraco, afinal já o tinha derrotado.

No entanto, apesar de cansada e com medo, vou ter de enfrentá-la. - É repugnante. Tão feia, mal consigo olhar para ela.

Reúni todas as minhas forças, cravei a minha mão no punho da espada e apliquei os meus melhores golpes, as minhas melhores técnicas. Mas nada, a aranha parecia nem sentir a espada a bater na sua carapaça negra e gélida. Continuava a olhar para mim, a babar uma espuma verde, e parecia rir.

Guardei a espada e saltei, mesmo ferida ainda consegui impulsionar-me o suficiente para saltar por cima da nojenta aranha. Estava no túnel e não havia outra coisa a fazer, tinha de fugir dali, a aranha perseguia-me... comecei a correr, a aranha corria atrás de mim. Ficava sem forças mas a aranha não parava. Continuava cansada, com frio e acima de tudo com medo de não conseguir sair dali. E corria, corria.

Mas de repente o túnel assustador acabou, o único caminho que havia era para baixo. Conseguia sentir a respiração daquele aranhiço asqueroso no meu pescoço, arfava, cheirava mal. Não havia tempo para pensar, ou saltava ou era morta por aquele monstro. Preferia morrer da queda! E saltei.

Caí, caí e caí mais um pouco. Via ao longe a expressão sarcástica do aracnídeo, parecia saber algo que eu não sabia. A queda não terminava, cada vez estava mais frio, cada vez tinha mais dores, cada vez tinha mais medo de não voltar a ver a luz do dia.

De repente, parei. Parecia que alguma força me amparava e me pousava delicadamente no chão. Outra galeria, outro buraco negro. Pouco via, tinha frio, sentia o sangue a escorrer pelo meu corpo. Precisava de descansar. Como vim parar a esta gruta?

A aranha, estava ali outra vez. Como seria possivel? Como tinha conseguido seguir-me? Como ainda estou viva?
Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhh - Gritei, gritei, gritei mas não valia de nada, ninguém iria ouvir os meus gritos naquele buraco, ninguém viria em meu auxilio.
Ela avançava para mim, com um ar ameaçador, abanando as suas presas que faziam barulho, pior que o silvo das espadas quando vamos trespassar um adversário. Não havia nada a fazer, senão deixar-me morrer.
Já imaginava aquele vil monstro a estraçalhar-me, a comer as minhas entranhas. - Vou desitir. Para quê lutar? A minha espada não lhe faz nada.

Já não tinha medo, sabia que ia morrer. E da morte eu não tinha medo. Sou uma guerreira, fui treinada para a batalha e para a morte desde criança. E então a aranha parou. Mais uma vez fitou-me, desta vez já não tinha aquele olhar sarcástico parecia triste, até parecia mais pequena. Olhou para mim e disse:
- Chamo-me Kali e sou a tua aranha. Alimento-me dos teus medos e das tuas fobias. Vá, dá-me de comer. Tu és a minha criadora, nós somos uma. A partir de hoje vou perseguir-te para sempre. Alimenta-me. Faz-me crescer! Continua a demonstrar o medo que tens por estar aqui sozinha e ferida, deixa-me dominar-te. Deixa os teus medos e os teus receios tomarem conta de ti. Deixa-me controlar as tuas acções. Deixa-me mandar, enquanto tu ficas aí pequenina e indefesa.

Foi então que percebi, esta aranha não existe. Esta aranha é apenas fruto da minha imaginação. Talvez me tenha deixado dominar pelo medo, quando caí no buraco, logo depois de ter morto o Ryūjin. Foi uma luta dificil, que por pouco não perdi. É normal que tenha sentido medo quando ele me encurralou, mas consegui escapar-me e cravar-lhe a espada no único ponto fraco. Não sei porque perdi o controle depois disso, deve ter sido da adrenalina da queda, dos ferimentos, de não saber como sair desta gruta. Dei liberdade à aranha para crescer. Mas se fui eu que a criei, também eu a posso destruir.

- Eu não tenho medo de ti! Tu não existes. - gritei - és apenas fruto da minha imaginação, és o reflexo dos meus medos e das minhas dores. Tu não existes. Tu não existes. - cada vez gritava mais alto e a aranha ficava mais pequena, mais pequena, mais pequena. Até que desapareceu.

Sinto-me tão fraca, acho que vou desmaiar. Deixei cair a espada, já não havia nada por que lutar. Continuava ferida e perdida naquela gruta sem fim. Sem forças para andar, mas estava sozinha. Nenhum medo me assombrava naquele momento.

Acordei no templo, com as feridas a começarem a sarar. Até hoje não sei como saí da gruta.

4 comentários:

Suellen Brito disse...

menina você escreve muito bem
simplesmente perfeito!

Helena disse...

Olá... adorei o modo como escreve... como posso acompanhar seu blog?

Mãe Jo disse...

Olá... por incrivel que pareça estava a tomar banho e o texto foi-se formando. Até saí do banho à pressa e tudo mas não me escapar nada :D

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Espero mesmo que continues a visitar-me.

bj

Helena disse...

Muito obrigado pela reposta e é claro que continuarei vindo e acompanhando suas "escritas"... bjs